De repente, tudo pode mudar de lugar
Ludimilla Carvalho Serafim de Oliveira
O brasileiro acostumou-se a aceitar as disputas eleitorais como esperança de solução para qualquer tipo de problema. Basta pintar uma disputa voto a voto para os ânimos se aflorarem, os sentimentos se exaltarem, os conchavos iniciarem suas performances estratégicas com vistas à vitória. O problema é que temos participado de tudo isso sem critérios rigorosos, muitas vezes movidos mais pela paixão do que pela razão. Temos aceitado mentiras produzidas por um belíssimo e moderno marketing, candidaturas nascidas de popularidades momentâneas, apoiadas por personagens erroneamente endeusados, além de comprarmos facilmente ‘ideologias’ apenas pela necessidade de ‘termos uma para viver’, como revelou Cazuza.
O resultado não tem sido bom, tem causado retrocessos, tem alimentado a rede de corrupção que esvazia nosso potencial de desenvolvimento em todas as áreas. O pior é que vivemos um estado de direito democrático que reflete, exatamente, o fiel compromisso que o brasileiro tem para com a sua própria responsabilidade civil, social e cidadã. Qualquer um pode fazer sua própria pesquisa. Pergunte aos amigos e parentes, caso eles ocupassem algum cargo de poder, se teriam coragem de desviar dinheiro público ou se beneficiar do cargo para proveito próprio.
A opção de O BOM DE MOSSORÓ em entrevistar a professora Ludimilla Oliveira, uma declarada candidata ao cargo de reitor da Universidade Federal Rural do Semi-Árido (UFERSA), carrega uma esperança de que podemos reverter este histórico negativo do setor público brasileiro, inserindo valores positivos à administração pública. Sua vida, relatada a seguir, nos oferece um exemplo de muito trabalho, estudos, perseverança e atitudes que são os únicos caminhos capazes de fazer o Brasil encontrar um rumo. Por enquanto, diante do quadro político administrativo em que o país está inserido, tem sido difícil visualizar ao menos um fleche de luz indicando dias melhores.
PERÍODO DE SUPERAÇÃO – Ludimilla nasceu em Mossoró no dia 20 de julho de 1975, filha de Antonio Serafim Filho e Maria do remédio Carvalho Serafim. Foi a primeira dos três que o casal colocou no mundo. Ludineide hoje é empresária do ramo de confecções em Maceió, com grande reconhecimento no mundo da moda na capital de Alagoas. Luciano é inspetor de ultrassom em empresa prestadora de serviços ao setor de Petróleo, além de ser um missionário atuante da Assembleia de Deus em Mossoró.
Ainda pequenos, os três irmãos viram o pai se aposentar com apenas 36 anos por invalidez, devido problemas neurológicos provenientes de seu trabalho no laboratório da fábrica de cimentos Itapetinga. Três anos antes, seu Antônio teve que parar de trabalhar para se tratar no Piauí, terra dos pais de dona Remédio. Ludimilla tinha oito anos quando a família se mudou para o município de Piracuruca, distante 240 quilômetros de Teresina, capital do estado. Esta opção se deu pelo prestigio político que seu avô Juvenal tinha na época, o que facilitaria o tratamento de saúde necessário para o pai.
Sua mãe, cabeleireira e costureira, hoje aposentada devido problemas decorrentes do Lúpus, uma doença autoimune que ataca tecidos saudáveis do corpo por engano, não ficou parada nos dois anos em que passaram por lá. Colocou um salão e trabalhou muito para quando voltassem para Mossoró tivessem pelo menos o dinheiro de comprar uma casa.
“Meu pai se recuperou e minha mãe não só comprou uma casa na rua Francisco Pascoal, no bairro Santo Antônio, como também uma caçamba que durante alguns anos serviu como trabalho autônomo de meu pai. A casa causou preocupação na família por ser vizinha de casas ‘não tão familiares e bares’, mesmo assim, minha mãe abriu o salão e juntou dinheiro para adquirir uma nova casa no bairro Nova Betânia. Foram mais de 20 anos com o salão aberto em Mossoró, reconhecido pela sociedade e que trouxe satisfação e estabilidade para a família”, reconhece Ludimilla.
Ao mudar-se para a rua Expedicionário Maurício Pinheiro, casa onde moram até hoje, seu Antônio foi vender leite de casa em casa, enquanto a mãe, além de trazer o salão, também abriu um comércio de cereais. Foi onde Ludimilla estreou na atividade de vendedora, aprendendo todas as técnicas comerciais necessárias para desenvolver as atividades que viriam a seguir em sua vida.
A MENINA VAI CRESCENDO E VIRANDO MULHER – A trajetória escolar de Ludimilla começa com as aulas de alfabetização de dona Zina, passa pela escola de freiras Patronato Irmãos Dantas, no Piauí, pela escola da Fábrica Guararapes e pelas escolas estaduais Centenário, Elizeu Viana e Moreira Dias, onde terminou o ensino fundamental. O médio fez em duas escolas: o técnico de contabilidade na União Caixeral, e o chamado científico no União Colégio e Curso, para se preparar melhor para o vestibular.
Ainda menina, teve oportunidade de trabalhar durante um ano em uma loja de confecções de dona Maria das Graças e de seu Fernando de Melo, um dos fundadores do curso de Ciências Contábeis da UERN. Com o fechamento desta loja, Ludimilla começou a empreender. Foi sacoleira, comprando roupas em Fortaleza e também de várias pronta entregas, até decidir que era hora da família trocar o comércio de cereais pela loja de confecções ‘Ludimilla Variedades’. Com documentação legal, começaram a investir em marcas como a Marisol, vendo os resultados melhorarem rapidamente.
Trabalhando e estudando sem descanso, Ludimilla tinha 15 anos quando, no primeiro dia de aula do segundo ano do Técnico de Contabilidade, ver entrar para dar aula um professor diferente, que a fez sentir uma sintonia, uma empatia que até hoje não sabe explicar ao certo. Era o professor Chico Oliveira.
Logo ficaram amigos e por ela demonstrar ser muito estudiosa, interessada em aprender e bastante profissional, logo foi criada uma relação de admiração e confiança que os onze anos de diferença entre suas idades pouco importou. Ela aceitou a bolsa de estudos oferecida por ele no União Colégio e Curso, do qual era um dos cinco sócios, como também aceitou seu pedido de casamento, ocorrido em 23 de abril de 1992, relação que resultou no nascimento de um único filho: Galileu Galilei, nome de um físico, matemático, astrônomo e filósofo italiano que foi personalidade fundamental na revolução científica.
“Foi uma gravidez de alto risco para encerrar o ano de 1992 como o mais intenso de minha vida. Nele casei, conclui o curso técnico, expandi minha loja e fui mãe”, relata. Precisou de seis meses para se recuperar psicologicamente do parto que a fez perder muito peso, morando ainda na casa dos pais. Problemas que não a impediram de passar em 10º lugar no vestibular de Ciências Econômicas da UERN.
AMPLIANDO CONHECIMENTOS E EXPERIÊNCIAS – A irmã passou a gerenciar a loja e Ludimilla passou a se dedicar apenas aos estudos e a família. Depois de dois semestres na UERN, decidiu juntamente com Chico dar um pouco mais de tempo para criação do filho. Foi quando ela decidiu dar aulas particulares em casa. Começou com uma única aluna. Dez anos depois, quando encerrou essa atividade extra, tinha setenta alunos matriculados em sua própria casa, um verdadeiro colégio de uma única professora. “Eu construí uma sala de aula que chegou a ter 30 alunos em um só período”, conta.
Em 1999, resolveu voltar para universidade depois que sua mãe identificou que muitos de seus alunos já estavam se formando. Fez vestibular para Serviço Social apenas por ser a melhor opção que tinha no período matutino, na UERN, curso que concluiu em fevereiro de 2003. No mês seguinte entrou no mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente, pela rede Prodema em convênio com a UERN, foi quando decidiu encerrar suas aulas em casa.
Sua experiência como professora, porém, levou-a a dar aulas em convênios como o Proformação da UERN e em cursos de pós-graduação. Por mérito acadêmico, ganhou da Coordenação de aperfeiçoamento do ensino Superior (CAPES), ligado ao Ministério da Educação, uma bolsa de estudos que lhe deu as condições necessárias para se dedicar apenas ao mestrado. Ao concluir, em 2005, ingressou em uma especialização em direito Ambiental, pela Faculdades Integradas de Patos/PB.
Nos anos de 2006 e 2007, a orientadora de mestrado de Ludimilla, Françoise Dominique Valéry, a convida para coordenar uma pesquisa pelo Ministério do Trabalho na área de Economia Solidária. Ela fica responsável pelas regiões Central e Oeste, coordenando o mapeamento de todos os empreendimentos neste setor. Encerrada a pesquisa, ainda permaneceu com o grupo de trabalho na qualidade de pesquisadora em projetos de elaboração de Planos Diretores Municipais.
Em 2008, fez a seleção de doutorado em arquitetura e Urbanismo da UFRN e foi aprovada em primeiro lugar. Já era professora da UNP, em Mossoró, na área de Avaliação de Impactos Ambientais do curso de Gestão Ambiental e continuava a dar aulas de pós-graduação em Metodologia Científica. Em 2009, recebeu outra bolsa do CAPES para se dedicar de forma exclusiva ao doutorado. Antes, em dezembro de 2008, havia sido aprovada em concurso da UFERSA para lecionar Organização, Sistemas e Métodos, sendo chamada apenas um ano e quatro meses depois.
NA UFERSA, RECONHECIMENTO E TRABALHO – Já são cinco anos vivendo intensamente o mundo acadêmico da UFERSA. Apenas 40 dias depois de sua entrada nesta universidade, ao fazer o trabalho de divulgação de seu primeiro livro, ‘O Olhar da Águia, para o Rosado da Caatinga’, lançado em 2010 e que trata da degradação ambiental provocada pela extração de lenha utilizada pela indústria da caieira, o então reitor Josivan Barbosa a convida para assumir o cargo de assessora na Pró-Reitoria de Extensão.
Um ano depois, passou a ser pró-reitora substituta até assumir a titularidade em 2012. Ficou no cargo até a posse do novo reitor José de Arimatéia, que a convidado para assumir o cargo de coordenadora na própria pró-reitoria, não aceito por ela. “Não tinha empatia com a proposta de gestão da atual administração”, explica. A partir deste momento, Ludimilla passou a se voltar inteiramente a seu departamento, do qual em momento algum havia se afastado, nem das aulas, nem das pesquisas.
Hoje é a chefe do Departamento de Agrotecnologia e Ciências Sociais, que conta com quase 120 professores dos cursos de Direito, Administração, Ciências Contábeis, Educação do Campo, Engenharia Química, além de várias áreas do conhecimento ligadas às Ciências Sociais Aplicadas. Nos anos de 2013 e 2015 também foi a mais votada para o Conselho Universitário (CONUNI), comprovando a boa aceitação de seu nome entre os professores da instituição.
Sobre o lançamento de seu nome para disputar a reitoria no ano que vem, pensa ser um processo natural. “Minha determinação, perseverança, disposição e amor pelo trabalho na UFERSA fazem com que eu encare os desafios sem nenhum receio. Aprendi que a vida é uma escola com lições diárias, onde é preciso humildade para que continuemos aprendendo sempre. Nunca podemos pensar que seremos alto suficientes. Tenho fé que todos nós temos missões a cumprir para que possamos passar pelas experiências necessárias a nossa evolução. Procuro estar preparada para os novos compromissos, porque sei que, de repente, tudo pode mudar de lugar”, resume Ludimilla, quem sabe um fleche de luz a sinalizar novos tempos.
Fonte: http://www.obomdemossoro.com.br/#!DE-REPENTE-TUDO-PODE-MUDAR-DE-LUGAR/c1sbz/5661940e0cf203d325e9e028